O Saca-rolhas é um objecto tão corrente e tão banal para a maioria dos portugueses que, o mais provável, é muitos deles nunca o terem “visto” com verdadeira atenção, ou como se diz popularmente com “olhos de ver”.
Na verdade esse fenómeno sucede com outros tantos objectos que de tal forma fazem parte do nosso quotidiano que mal reparamos neles, limitando-nos a saber que existem, e que estão ao nosso dispor quando deles necessitamos…
Mas não é esse certamente o caso do saca-rolhas que vos vamos apresentar, pois a sua forma é manifestamente diferente da configuração dos demais saca-rolhas; resultou da abordagem de uma finalista de uma licenciatura em Design Industrial e que, após a conclusão do curso, decidiu dar vida ao objecto que concebera, criando uma empresa para a comercialização do mesmo.
Mas, regressando aos objectos que nos rodeiam no nosso dia-a-dia, não nos podemos esquecer que para que eles existam, necessitaram que alguém (ou um conjunto de pessoas) se debruçasse sobre o seu desenvolvimento e aperfeiçoamento.
Para essa função, com o desenvolvimento da sociedade industrial, foram surgindo profissionais cujo saber se foi dedicando a aperfeiçoar o desenho dos mais distintos objectos, com o propósito de os tornar mais eficientes, mais práticos e finalmente mais agradáveis, para os seus futuros utilizadores. Esta foi, em traços muito largos, a génese do nascimento do moderno desenho de produto, ou Design Industrial.
Para ilustrar o interesse que o Museu do Saca-Rolhas coloca nesta temática, resolvemos debruçar-nos sobre um caso concreto, um saca-rolhas que será muito provavelmente desconhecido da maioria dos nossos leitores – excepção feita aos nossos inúmeros amigos e seguidores do Facebook e do Pinterest – mas que julgamos ser interessante não só de um ponto de vista funcional, mas também para exemplificar aquilo de que falamos. A isto acresce ainda o facto de a sua criadora, Line Bogen, ter sido uma das primeiras Designers a interessar-se pelo projecto Museu do Saca-Rolhas e a iniciar connosco uma parceria.
Line T. Bogen, é uma jovem designer de 28 anos, nascida em Oslo, na Noruega, tendo-se licenciado em Design Industrial pela University college of Oslo and Akershus, em 2011.
O seu trabalho de fim de curos, o saca-rolhas LTB, resultou numa visita ao Musée du Vin, em Paris, o que lhe deu a ideia de reflectir sobre esse objecto mágico indissociável dos bons vinhos, que é o Saca-Rolhas. Este pequeno facto é para nós também um estímulo muito especial, prova de como um Museu é algo que pode servir para inspirar o surgimento de novas criações e, no caso específico do Museu do Saca-rolhas esse é mesmo um dos nossos desígnios principais.
Regressando a Line Bogen, o seu trabalho de finalista, o saca-rolhas LTB – acrónimo de Le Tire-Bouchon, ou seja, O Saca-Rolhas, mas também iniciais do nome da sua criadora, Line Thorvildsen Bogen – foi de tal modo apreciado que rapidamente surgiu a ideia de tornar este simples projecto, num objecto concreto susceptível de comercialização.
Surgiu assim a jovem empresa Zurreball, que tem como objectivo vir a ser uma inovadora marca norueguesa de produtos de design de alta qualidade para o lar.
O objectivo de Line Bogen é continuar a desenvolver novos produtos que completem o saca-rolhas LTB, sendo o próximo previsto, um corta cápsulas de garrafas de vinho, cujo lançamento deverá ocorrer em 2015.
Outro dos interessantes objectivos da Zurreball é o de tentar que toda a produção seja inteiramente europeia, preferencialmente fabricada na Noruega. Obviamente que tal facto tem implicações de custo, mas também assegura uma qualidade de todas as peças, que nem sempre se verifica noutros casos. Na nossa constante análise de saca-rolhas temos mesmo constatado que outros projectos de novos saca-rolhas, embora dotados de um bom design, provavelmente não alcançam o sucesso que mereciam, devido ao seu fabrico ser colocado nas mãos de empresas asiáticas, nem sempre focadas na qualidade…
Não é este o caso do Saca-Rolhas LTB, e no domínio da qualidade dos materiais empregues, nenhuma critica lhe pode ser feita.
Outra das vantagens concretas de tentar trabalhar sempre com empresas “locais”, é também o facto de facilitar um melhor e mais profícuo diálogo entre o Designer, e o fabricante, do qual podem resultar melhoras significativas no produto final. No caso em análise, da relação estabelecida pela nossa Designer e a empresa encarregue de fabricar as duas partes fundamentais do saca-rolhas, duas semiesferas em matéria plástica, surgiu a eleição do plástico mais adequado para este efeito, o ELASTRON V.
O LTB é um saca-rolhas cuja produção se iniciou em 2012, com um design e forma de funcionamento bastante originais, mantendo no entanto um bom desempenho para a sua função. Aliás, o seu aspecto original, a excelência do seu Design é algo que fica logo evidente para quem o contempla.
Extremamente simples na sua concepção, é composto por apenas seis peças, mais uma peça em acrílico, cuja função é apenas de protecção da espiral extractora das rolhas. O corpo central é constituído pelas mencionadas semiesferas de um plástico do tipo borracha, onde assentam três peças em alumínio; uma no topo, onde é fixa a espiral, outra no centro, unindo as duas peças plásticas, e uma na base, que irá assentar no topo do gargalo da garrafa que se vai abrir; rodamos a esfera, a parte central comprime-se e…Ploc! Momento mágico em que a rolha desliza suavemente, para podermos finalmente disfrutar de um fantástico vinho!
Na sua aparência o LTB trata-se de uma bola, ou esfera, dotada no seu centro de uma longa espiral helicoidal, revestida a teflon. Este tipo de revestimento é aliás hoje em dia quase que uma norma imperativa, seguida por um crescente número de fabricantes de saca-rolhas, dado este material reduzir significativamente o atrito necessário para perfurar as rolhas das nossas mais queridas garrafas de vinho.
Mas nem sempre foi assim, e a adopção de um revestimento de teflon, bem como de espirais longas nos saca-rolhas, foi uma espécie de “ovo de Colombo”, inventado e patenteado pelo inventor Norte-americano Herbert Allen, em 1979, ano em que também fundou uma das actualmente mais famosas marcas de saca-rolhas mundiais, a Screwpull. Esse saca-rolhas de Allen é de tal forma considerado um clássico, que faz mesmo parte da colecção do MoMa de Nova-York e obviamente também das colecções do Museu do Saca-rolhas!
Esta invenção, aparentemente simples, deu origem a uma grande batalha legal, pois no momento do registo da sua patente, um grande e reputado fabricante Holandês encontrava-se prestes a comercializar um saca-rolhas que, embora mais sofisticado, também assentava numa espiral do mesmo tipo…Bom, mas essa é outra história, que talvez fique para um próximo artigo.
Para um enófilo, este tipo de espirais longas inventadas por Allen, só apresenta um inconveniente, o de perfurar as rolhas na sua totalidade… Esta é uma consequência inerente a todos os saca-rolhas dotados deste tipo de espirais mas que, simultaneamente, tornam a tarefa de abrir qualquer garrafa de vinho, muito mais simples.
Quanto à forma esférica do LTB, tem um tamanho que a nosso ver se adequa perfeitamente à mão da maioria dos adultos, e lhe confere simultaneamente uma aparência de obra de Arte. Esse era aliás um dos objectivos da sua criadora, que não só pretendia criar um objecto altamente funcional mas que fosse também, de um ponto de vista do seu desenho formal, uma verdadeira obra de arte.
Sendo um objecto diferente dos demais, e apesar de a sua utilização ser no geral bastante intuitiva, requere ainda assim algum período de adaptação ao mesmo. Mas não é isso que sucede quase sempre com qualquer produto inovador?
Quanto a nós este saca-rolhas trata-se de uma belíssima peça de design actual, motivo pelo qual vos decidimos falar sobre ele; Afinal de contas os saca-rolhas não são todos iguais, longe disso.
Também o facto de se tratar de uma jovem empresa, criada por uma jovem designer, que aposta na qualidade e inovação, é algo que não nos poderia ser indiferente.
Afinal de contas apostar na divulgação de trabalho que visa a excelência, seja ele nacional ou estrangeiro, e que contribua para enaltecer o universo dos grandes vinhos e da cortiça é e será sempre um dos objectivos principais do Museu do Saca-rolhas.
Por isso, e para concluir, vos dizemos : Viva o Vinho, viva a Cortiça, viva o Saca-Rolhas!
por Lopo de Castilho
licenciado em História, desde longa data tem participado em diversas iniciativas de promoção de Vinhos e de defesa de produtos de Denominação de Origem controlada, como por exemplo as iniciativas “Projecto Douro” e “Arte de Ser Português”; Foi director de uma Cooperativa de produção de Azeite, sector no qual já trabalhou e é actualmente responsável por uma pequena casa agrícola tradicional, no Douro Superior, produzindo uvas de qualidade, para vinhos do Douro e Porto. Presentemente é também o iniciador e responsável pelo projecto Museu do Saca-Rolhas.
