Mara Pedro

Mara Pedro

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Descobri que, afinal, é uma menina simples, sempre de sorriso no rosto e que a sua paixão pelo fado nasceu quando tinha 4 anos, ao ouvir voz da Amália Rodrigues, numa barraquinha de música, na praia da Barra, em Aveiro.

Mara… 16 anos dos quais 12 anos a cantar… muitas histórias deves ter para contar!
M: Realmente o fado faz parte do meu crescimento, não me reconheço sem ele.

As crianças começam a cantar na escola, também foi assim contigo?
M: Na verdade eu já cantava antes de ir para a escola…sempre cantei…é algo que me acompanha. O meu instrumento está dentro do meu corpo, portanto cantar faz parte de mim e o FADO foi sempre a minha eleição!

Como foi receber o 1.º lugar no concurso de Fado em Alverca, onde participaram tantos fadistas e tu tinhas apenas 9 anos?
M: (risos) Lembro-me que havia muitos concorrentes e eu era a participante mais nova. A noite prolongou-se até de madrugada e….quando anunciaram o meu nome eu estava a dormir no colo da minha mãe. Conheci nessa noite a mãe da fadista Raquel Tavares que estava ao meu lado e gritava “Ah fadista… pareces a minha Raquel quando era pequena, com essa rosa vermelha”. Seguiram dois autocarros de Viseu para Alverca nesse sábado, para a noite de Fados e regressaram no domingo à hora da missa (risos).

Seguiram-se mais prémios?
M: Sim …participei em muitos concursos pelo país….maioritariamente no Algarve e fui conquistando aí alguns prémios, com valores monetários que permitiam a minha participação, pois de Viseu ao Algarve ainda era longe. Houve uma semana que fomos para o Algarve duas vezes. Eu era sempre a mais nova das concorrentes. Era eu com 9 e os outros com idades entre os 18 e 45 anos. No último concurso em que participei, o júri
disse-me que eu não deveria concorrer mais….deveria fazer espetáculos!
Eu só tinha 9 anos, mas todos me viam como se tivesse mais e isso aumentava cada vez mais a minha responsabilidade. Nunca senti que me facilitavam a vida por ser tão jovem, era sempre o contrário, tive sempre de provar que merecia estar ali. Os músicos olhavam para mim com alguma pena…mas depois de me ouvirem tudo mudava. Lembro-me num concerto que fiz em Paris, onde fui acompanhada por músicos residentes… o guitarrista veio confessar-me no final do concerto “Ai menina, tiro-te o chapéu…quando olhei para ti vi-te tão pequenina… e nos ensaios estavas tão envergonhada que pensei…coitadinha, vai ser lançada às feras” (risos).

Houve algum prémio que te deu mais prazer?
M: Todos os prémios foram importantes e tiveram um significado muito especial, pois todos me ajudaram a crescer, e um artista sem história é como um povo sem raiz. Contudo houve um que me deixou especialmente feliz. Eu tinha 9 anos….a minha mãe adaptou o meu vestido de comunhão, com uma faixa verde, o meu pai deu-me um alfinete com uma clave musicalem prata e lá fomos para Lisboa. Concurso dos jovens cantores CLAVE DE PRATA, em Carcavelos. Foi o único concurso em que participei, onde todos tínhamos idades aproximadas. Concorri com uma canção inédita, POVO INTEMPORAL, composta por mim e pelo meu professor de piano na altura, José Carmo. A letra era de uma psicóloga amiga da minha mãe, a Ana. Ganhei o 1.º lugar com a melhor música, melhor letra e melhor interpretação.
Foi especial porque quando estavam a anunciar o vencedor, os outros concorrentes gritavam o meu nome….todos gostaram do meu tema e isso deixou-me muito contente….

E os concursos televisivos?
M: Os concursos foram uma grande experiência e foi também uma época em que fui alvo de muita exposição mediática. Surgiu o concurso da SIC, Portugal tem Talento, ao qual concorri e fiquei apurada até à gala final. Acontece que na mesma altura iniciaram o concurso da TVI, UMA CANÇÃO PARA TI, concorri e também fiquei apurada. Por mim ficava nos dois, mas em termos televisivos isso não era possível e tive que escolher! A SIC não gostou que eu tivesse desistido em prol do concurso da TVI, mas se tinha que escolher, escolhi aquele onde todos tínhamos idades aproximadas. Aprendi muito com os concursos, principalmente a gerir os meus medos, dominar situações e saber lidar e gerir o imprevisto.

Não é muito vulgar alguém da tua idade ter um CD editado, contudo tu já tens 3, sendo que o último foi lançado quando tinhas 15 anos, podes contar-nos porquê?
M: Na verdade o 1.º CD DOCE FADO, com temas maioritariamente tradicionais e com dois inéditos, foi uma necessidade… eu tinha 11 anos mas já cantava há sensivelmente 6 anos e já tinha feito algumas gravações FADO PORTUGUÊS, CANÇÃO DO MAR…. que passavam na rádio que me deu voz, a Emissora das Beiras. Cheguei a participar num CD de músicas de criança, quando tinha 8 anos, chamava-se CASINHA DO DRAX, onde tinha uma música AS CORES. As pessoas pediam essas gravações mas a rádio precisava de algo registado, daí o aparecimento do 1.º albúm, que foi um sucesso… teve que ser editado duas vezes. Aos 14 anos gravei novamente, a minha voz estava diferente, mais madura nessa altura. Conheci em Espanha, depois de um concerto, um grande músico argentino, Daniel, que me convidou para gravar. Surgiu assim FADO ALMA DO MUNDO, porque eu era a única portuguesa entre eles, espanhóis, com musicalidades muito diferentes, mas que me encantaram. No ano seguinte, com 15 anos, entro em estúdio novamente para gravar FADO SORRISO, produzido por um grande músico, CUSTÓDIO CASTELO que se encantou com a minha voz, considerou ter maturidade vocal invulgar para os meus poucos anos.
Não existe uma data pré-definida para gravar, é um caminho feito com trabalho, no qual me empenho cada vez com mais vontade e, claro que o 4.º CD também está a ser preparado, neste quero cunhá-lo com temas escritos e musicados por mim, para que possa defendê-lo melhor… para que seja um pouco a minha história…como nos fados de Amália, se os escutarmos com atenção percebemos toda a sua vida.
Gosto do piano e tenho aulas desde os meus 8 anos. Agora que terminei o 11.º ano com sucesso e no 12.º sei que vou ter mais tempo disponível, porque são menos disciplinas, quero dedicar-me mais à minha música….é possível que procure neste instrumento alguns temas.

A pergunta que deves ouvir sempre: o que queres ser quando
fores grande?
M: (risos) Penso que já quis ser tudo! Massagista, Fisioterapeuta…. enfim, gosto muito da área das ciências e tem sido a minha escolha escolar, contudo começo a perceber o que quero fazer para o resto da minha vida, pelo que vou preparar-me para prestar provas em Fevereiro de 2016, na ESMAE, Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo, para entrar em CANTO…quero estudar também composição!

Tens feito muitos concertos no estrangeiro. Como é cantar além
fronteiras?
M: Tenho feito cada vez mais concertos no estrangeiro. Cantar fora do país permite-me crescer, porque é muito enriquecedor conhecer outras culturas, outros lugares, outros públicos. Mas também me leva a uma preparação mais cuidada, onde a escolha do reportório é pensada para cada público, onde o meu inglês é posto à prova, pois vou a lugares onde não existem portugueses na plateia e tenho que comunicar com eles. Cantar
Fado tem sido uma segunda escola para mim, que caminha lado a lado com a escola regular.

Estar longe de Lisboa é um impedimento no teu progresso artístico?
M: Penso que não! Devido à minha idade a minha mãe nunca viu com bons olhos as casas de fado, pois o horário era impróprio para uma criança como eu, penso que ainda hoje ela pensa assim e eu já tenho 16 anos (risos). Raramente fui… lembro-me da primeira vez… tinha 8 anos! Tanto pedi aos meus pais que lá me fizeram a vontade. Fomos ao CLUBE DE FADOS em Lisboa!
Os fadistas dessa noite eram a Cuca Roseta, o Miguel Capucho e a Joana Amendoeira. Nunca mais irei esquecer…. o sono estava a dominar-me! Só despertei quando chegou a minha vez. Comecei a cantar a seguir à Joana….era 1h da manhã. Ouvia a minha mãe a arrastar o meu pai para irmos embora, mas o meu pai percebeu que todo o meu esforço merecia a espera. O grande Mário Pacheco olhou para mim com uma certa pena, mas depois consegui arrancar-lhe um grande sorriso. Os outros músicos sorriam enquanto tocavam e isso aumentava a minha segurança. Recordo-me do Miguel Capucho me dizer “estiveste muito bem miúda”.
Estar longe de Lisboa fez com que seguisse outro percurso, habituei-me a gerir os meus espectáculos, a proteger a minha voz utilizando o microfone….nas casas de fado os jovens esforçam muito a voz, que ainda não está formada. Escolho os músicos que gosto que me acompanhem, preparo o meu espetáculo, enfim…. adoro o público e o palco.

Esperas um dia ser uma fadista famosa?
M: Cantar fado tem uma responsabilidade acrescida…não é uma música qualquer, é a “nossa música”, património português que temos que divulgar com muita dignidade e respeito, porque estamos não só a mostrar a nossa voz, mas também a partilhar a nossa cultura.
Espero continuar a ter a voz que Deus me deu e continuar a amar cantar o nosso FADO. O meu sonho é cantar em todos os lugares do mundo, como fez a Grande Amália, se isso é ser famoso então hei-de ser, porque quero muito!

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